Quarta-feira, 31 de Janeiro de 2007
Agora que o mês de Janeiro está a terminar ficam aqui duas memórias:
1ª - No dia 2 de Janeiro de 1921 o Presidente da Junta de Freguesia de Valverde,Manuel Nunes,faz uma proposta para que o Carvalhal fosse dividido em glebas pelos chefes de família desta freguesia e aforado por um quarto de centeio.
2º - No dia 5 de Janeiro de 1921 a Junta decide vender a Capela de São Sebastião em Valverde,para ajudar nas despesas com a nova capela que deve ser feita no Carvalhal do Povo por 230$00. É isso,duzentos e trinta escudos.
*Fonte :Livro de Actas da Junta de Freguesia.
Terça-feira, 23 de Janeiro de 2007
No Domingo ,no intervalo do jogo do nosso Desportivo, enquanto uns garotos se divertiam chutando para a baliza e gritando desvairadamente Golo! Golo! Golo !,sempre que a bola entrava , veio à conversa como era dantes.
Nós ,os garotos, podíamos jogar à bola em qualquer lugar : no Adro, no Arraial do Carvalhal, na Escola, em qualquer sítio onde se pudessem por duas pedras para servirem de balizas.Até na estrada.Sim ,até na estrada!
Assim se faziam os pequenos craques da nossa terra que sonhavam um dia poder vestir o equipamento do Desportivo. Jogos de muda aos cinco e acaba aos dez.Que muitas vezes viravam em pequena pancada de garotos. E ,como eram renhidos os jogos entre Valverde e Carvalhal, sem árbitro e com regras muito próprias.
Sonhando … que um dia vestiríamos orgulhosamente a camisola do Desportivo.
Por tudo isto e por todas as outras coisas se poderá afirmar que tudo se cruza com a poesia das coisas belas e simples da vida de um amante de futebol.
Matilde Rosa Araújo,professora,poetisa,escritora de contos para jovens, brindou-nos com a maravilha que se segue :
GOLO
Os meninos
Que jogam à bola na minha rua
Jogam com o Sol
E os pés dos meninos
São pés de alegria e de vento
A baliza uma nuvem tonta
À toa
Na luz do dia
E eu olho os meninos e a bola
Que voa
E oiço os meninos gritar . Go…o…lo!
E não há perder nem ganhar
Só perde quem os olhos dos meninos
Não puder olhar.
Certeza ,certeza, só uma :que poesia rima com futebol ,golo e alegria.
Quarta-feira, 10 de Janeiro de 2007
As janeiras, que este ano se voltaram a ouvir nesta terra,terão origem nas festas romanas das calendas que se celebravam em Roma no mês de Janeiro.
A Igreja católica afeiçoou estes traços pagãos cristianizando os costumes e as celebrações de acordo com a religiosidade dos tempos.
Assim, se cantam as janeiras ,na generalidade, entre o nascimento do Menino Jesus e o dia de Reis.
Socorro-me ,a partir de agora, de pequenos textos retirados do livro Ao redor do Fundão, de José Monteiro,para mostrar como eram as janeiras nos primórdios do século passado.
Rapazes e raparigas em grupos mais ou menos numerosos –por vezes homens de certa idade e condição social – saem,noite fechada ,a cantar as janeiras à porta das casas principais.Feitos os ensaios e demais preparativos com antecipação bastante , se não na própria noite de natal à roda do cepo ou madeiro ,todos se concertando à volta do de melhor voz que regra a música e dá o primeiro verso de cada cantiga.Por vezes cantam-se as janeiras com acompanhamento de instrumentos musicais : tambores,violas,ferrinhos,acordeão, etc.
“Em Valverde ,nas noites de Natal e Ano Bom,os quatros foliões do Espírito Santo ,acompanhados dos seis mordomos e do juiz ,tesoureiro e escrivão da mordomia ,saem a dar as janeiras com seus instrumentos e loas de tradição.Dentre os foliões o do tambor ,que é o principal ,regula a música e nota baixinho,o primeiro verso de cada cantiga.Toca o segundo viola e os dois restantes ,pandeiros – espécie de acinchos de castanho com soalhas de lata.
Dirigem-se primeiro a casa do juiz e, sucessivamente, à do tesoureiro,escrivão e mordomos.E todos em coro:
Vamos dar as boas-festas,
Festas com muita alegria,
Manda-as Dâs do céu à terra
E a Virzem Santa Maria.
As Janëras que cantemos
Amanhei s’hão-de tirare,
São pró Dvino Spirto Santo,
Que Ele mos há-de salvare.
Sobem em seguida as escaleiras do balcão e franqueia-se-lhes a casa,onde já os esperam as janeiras: filhós, papas, chouriças,morcelas,frutas e queijo.Cresce o entusiasmo ao redor da vasta mesa de jantar,onde tem lugar de realce o apetecido vinho-novo.Mas não há tempo para delongas, que importa correr as oito casas restantes – e vá de prosseguir nas romagem.
No dia de Bom Ano saem oficialmente pelo povo a tirar as janeiras ,depois da missa do dia.À frente ,o juiz ,o tesoureiro e o escrivão com bandejas para esmolas de dinheiro, e os seis mordomos com sacos para recolher «somente» e outros géneros.A seguir o Alferes com a bandeira e no couce os foliões ,tocando e cantando loas.Estas esmolas acumulavam-se depois às do «oitavário» ,colhidas durante os oito domingos da Ressurreição para as festas do Espírito Santo.” (sic).
Fala-se aqui da Folia do Espírito Santo e da sua composição. Voltaremos um dia destes a este tema (Folia) com o depoimento directo que recolhi de um dos últimos membros ,o tio Manuel Abrantes / Chona.
Sexta-feira, 5 de Janeiro de 2007
Receita de Ano Novo
Carlos Drummond de Andrade
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
Cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já
Vivido
(Mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo ,remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra
birita ,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
Passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
Para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
Pelas besteiras consumadas
Nem parvamente acreditar
Que por decreto da esperança
A partir de Janeiro as coisas mudem
E seja tudo claridade , recompensa,
Justiça entre os homens e as nações,
Liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, direitos respeitados ,começando
Pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano-novo
Que mereça este nome,
Você, meu caro, tem de merecê-lo,
Tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
Mas tente ,experimente , consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
Cochila e espera desde sempre.
Do blog amor e ócio.
Terça-feira, 2 de Janeiro de 2007
Agora que o Natal já lá vai não queria deixar de vos oferecer este pedaço de escrita ,que ao contrário do que possa parecer não é a utilizada nas mensagens dos telemóveis ,mas praticada pelos nossos antepassados Valverdenses (Século.XIX princípios do Século XX).
Uma das coisas que diferenciam os povos e afirmam a sua cultura é a língua.Aqui,a seguir, não reivindicaremos uma língua diferente mas assumiremos uma expressão muito própria e localizada.
O Dr José Monteiro na sua obra Etnografia do Fundão-Costumes ,cantares e tradições, escreve que havia um subdialecto do Fundão e que o seu epicentro se situava na freguesia de Valverde. Para o comprovar ,entre outras amostras,poder-se-á transcrever este pequena parte da página 23 da já referida obra:
“ Natal – cepo – im Valvârde tchammames-l’o madëro. Os rapazes que trérem o numarro no Vrão é qu’hem –dem ir a robá-lo.É aquaje sempre ma arvora – um carvalho velho ,frëxo,ó um toro grande.Ajuntem-se todos à maia-note,quando já stá tudo assossegado,e a primëra cosa a robér é um carro de boje pra irem busquér a arvora.Âste ano foi um frëxo grande qu’stava numa quinta do senhë Presedente da Cambra (mas nô sabiem qu’era dâle) ,às Ínsuas ,aquaj tão longe c’ma Valverde ó Fundão.Despoj de darrubédo sarrarem-no im tóres e careguéram o carro,fazendo âles de boje e intrando no povo já a passar das trrás da manheim,a cantar o M’nino Jasuse.Descarregarem atão o frëxo no adro e o carro forem pô-lo à porta do dono,daonde o tinhem levado.
Tudo isto se passava sempre nas vésperas da Senhöra da Concëcem,fequendo o madëro adiente da porta da igreja à’xperra da vespra do natale;peguem o fogo à intrada da note com silvas ,vides e lanha miúda.Quando o madëro já stá a ardâr questuma a rapaziada botar-l’im cima com pauso,sempre a cantarem o M’nino Jasuse e a dezârem:
-Arda o madëro! Arda o madero!
No falta quem pra note adiente les levem vinho ó adro pra eles boârem e a súcia.Na véspra do Ano Bom tornarem a acindâr os restos do madëro, e a volta o povo a ajuntér-se e a cantar como na Note do Natale”.
Para terminar um Ano Bom para todos.